TERÇA-FEIRA, 11 DE SETEMBRO DE 2012
Visita da Fabiana Sugimori
Neste mês o Curumim recebeu uma visita muito bacana, Fabiana Sugimori. Ela foi atleta de natação durante muitos anos e coleciona uma quantidade enorme de medalhas,
dentre elas duas de ouro e uma de bronze conquistadas em três Paralimpíadas. A Fabiana é uma pessoa muito divertida e respondeu todas as perguntas da galerinha,
principalmente sobre o fato de ser cega. Veja o que rolou neste encontro.
A criançada do Curumim estava muito ansiosa com esta visita. Nos encontros anteriores os educadores conversaram com as turmas sobre quem era esta convidada e sobre
o fato de ela não enxergar. Durante as conversas, todos compreenderam que uma pessoa sem a visão percebe o ambiente por meio de outros sentidos (que acabam se desenvolvendo
muito mais, como audição e tato) e que a colaboração de todos era essencial para que o encontro fosse legal. As crianças ficaram preocupadas em como a Fabiana saberia
quem estava perguntando, ou de como ela chegaria no SESC, além é claro: COMO ELA CONSEGUIA NADAR, mas essas perguntas ficaram guardadas para o dia do encontro.
Ao chegar no Foyer do teatro, Fabiana começou sua conversa dando algumas dicas de como as crianças podiam auxiliar uma pessoa cega.
1º Cegos não são surdos então não é necessário gritar para falar com eles.
2º Quando chegar ou sair de perto de alguém sem visão, toque levemente seu ombro para que a pessoa saiba o que está acontecendo.
3º Quando for guiar alguém, é importante que esta pessoa fique atrás de você, nunca na sua frente. Pessoas cegas colocam as mãos nos ombros, no cotovelo ou seguram
nas mãos de seus guias.
4º Se você estiver em um ponto de ônibus e uma pessoa cega te pedir ajuda para pegar o ônibus certo, não esquecer de avisar caso for embora antes. A pessoa cega
pode ficar lá, esperando você avisá-la por muito tempo.
A Fabiana tem uma bengala que tem rodinhas na ponta, e com ela consegue se locomover desviando de possíveis obstáculos.
Antes de começarem as perguntas, ela contou um pouquinho sobre sua vida.
Ela nasceu prematura, ou seja, ficou menos tempo na barriga da mãe dela, apenas seis meses e meio. Como nasceu muito pequenininha, ficou em uma incubadora (um bercinho
para bebês prematuros) e sua retina não desenvolveu da maneira que deveria. Com o olho direito não enxerga nada e com o olho esquerdo, consegue perceber se está
claro ou escuro.
Começou a nadar muito pequena, com apenas três anos e meio. Os pais colocaram todos os 4 filhos na natação porque uma vez eles fizeram uma visita a um sítio que
tinha um rio. Sua irmã foi andando pela plataforma que havia sobre o rio e caiu na água, como não sabia nadar quase se afogou e um tio teve que pular para salvá-la.
A mãe não queria que isso acontecesse de novo e colocou todos os filhos na natação.
Na escola aprendeu a ler e escrever pelo método braile. No começo usava uma plaquinha de metal com a qual fazia os pontinhos do braile, mas os pais puderam comprar
uma máquina para ela, e tudo ficou mais fácil. Os colegas de sua sala sempre queriam ditar o que estava na lousa e ela precisou fazer uma lista, assim, cada dia
era um que ajudava. Para brincar, até mesmo de futebol, os amigos seguravam sua mão e ela participava de tudo. Quando a bola era passada para ela, colocavam a bola
no seu pé e diziam que podia chutar. A ajuda dos colegas fez com que crescesse de maneira saudável.
Aprendeu também a escrever com letra de forma, pois os pais faziam as letras com barbante e ela podia tocar. Com isso aprendeu os formatos das letras, entretanto,
disse que sua letra é muito feia. Além das letras, os pais faziam casinhas, bolas e outras coisas, então ela sabe como são por causa destes desenhos feitos pelos
pais.
Além de nadar, quando pequena fez dança rítmica, tocou flauta e piano. Brincava muito com seus irmãos e andava muito de bicicleta, coisa que gosta muito até hoje.
Tem um irmão mais novo que cresceu sabendo que ela era cega, então para ele era super normal e a levava para tudo quanto é lugar e ela participava de todas as suas
brincadeiras.
Começou a competir com 12 anos e em 1996, com 15 anos participou da sua primeira Paralimpíadas, em Atlanta. Sua prova é a de 50 metros nado livre. Foi um susto,
pois a chamaram faltando apenas um mês para a competição.
Contou que durante a prova, estava em terceiro lugar mas enroscou o dedo na raia e caiu para sexta posição. Nas Paralimpíada seguintes nada deu errado e ela ganhou
medalha de ouro em Sidney (2000) e Atenas (2004), quando bateu o recorde mundial de sua prova. Em Pequim (2008), ficou com a medalha de bronze.
Ela mostrou a medalha de ouro conquistada em 2004. As crianças ficaram entusiasmadas de verem uma medalha olímpica tão pertinho.
Além da medalha, ela mostrou o objeto utilizado para avisar os nadadores de que estão prestes a chegar no fim da piscina, o Taper. Parece uma vara de pescar com
uma bolinha de tênis na ponta. Os treinadores combinam com os atletas de que quando tocá-los com o Taper, eles já sabem que estão prestes a fazer a virada para
continuar a nadar ou encerrar a prova. Se isso não for bem treinado e combinado, os nadadores podem se machucar, batendo as mãos ou a cabeça.
Disse que não sabe como as pessoas sem braços ou pernas conseguem nadar, porque apesar de cada um ter sua dificuldade, sempre achamos a deficiência do outro mais
complicada que a nossa.
Depois de tudo isso, começaram as perguntas.
Leonardo: Dizem que quando você pratica esporte desde criança você vai crescer bastante. Você nada desde pequena e ficou baixinha, por que?
Fabiana: É verdade, eu fiquei baixinha. Mas quando você faz esporte desde criança, você cresce mais saudável e aprende a ter disciplina.
Cayari: Como você vê horas?
Fabiana: Tem dois tipos de relógio. Tem um que é em braile e você abre ele e coloca os dedos para saber a hora. Este meu fala as horas para mim, mas este fala em
japonês. Eu tive que aprender as horas em japonês para entender.
Ela mostrou paras as crianças e eles ficaram impressionados.
Nicolas: O som das letras em braile é igual as nossas letras?
Fabiana: Sim, é igual. Nós brincamos que os olhos do cego são o tato e a audição.
Gabriela (Papo Geral): Você já sofreu algum tipo de discriminação por ser cega?
Fabiana: Não que eu me lembre, só seaconteceu alguma coisa quando eu era criança.
Alexandre: Como você usa o computador?
Fabiana: Eu uso um programa chamado NVBA que lê tudo o que está escrito na tela para mim. Uso o teclado normal, pois decorei as teclas. Não sei se vocês perceberam,
mas tem marquinhas nas teclas F e J. Isso me ajuda saber onde estão as outras. Não uso o mouse, mas aprendi os atalhos no teclado.
Karina: Como você aprendeu a nadar? Normalmente as pessoas olham para alguém realizando o movimento e o copiam, como você fez para aprender os movimentos da natação?
Fabiana: Para ensinar o cego tem duas maneiras: ou você toca a pessoa enquanto ela faz o movimento ou a pessoa segura em você e realiza o movimento. Foi assim que
eu aprendi a nadar.
Estevam (Papo Geral): Como você identifica o dinheiro?
Fabiana: Hoje as notas novas estão com tamanhos diferentes, então fica um pouco mais fácil. Mas, normalmente eu peço para alguém de confiança arrumar as notas para
mim, sempre do menor para o maior valor. Então as coloco na carteira deste modo.
Nós precisamos confiar nas pessoas, em relação a dinheiro ou a preço. Não é sempre que saímos com alguém ao nosso lado.
Júlia Santana: Como você saca dinheiro?
Fabiana: Normalmente eu vou direto no caixa, pois nas máquinas fica complicado, pois pode ter alguém por perto e eu não perceber.
Luan: No supermercado, como você compra os produtos?
Fabiana: Normalmente vou com alguém ao supermercado, mas hoje as embalagens já estão escritas em braile. Na minha casa deixo tudo organizado, de modo que saiba
onde as coisas estão. Meu guarda roupa está todo organizado pelas cores. Alguém me disse e eu deixo tudo separado. Se mudar de lugar, é um problema.
Rosi: Como você sabe das cores?
Fabiana: Isso é muito difícil. Como nunca enxerguei só sei o que as pessoas me disseram. Para combinar as roupas, sei que o preto combina com tudo e que o marrom
não. As pessoas dizem que fico bem de rosa, então procuro usar mais.
Luis Henrique: Já pensou em desistir da natação por conta da sua deficiência?
Fabiana: Por ser cega não, mas por conta dos treinos e das dificuldades do dia a dia sim. Eu treinava todos os dias das 8 da manhã até às 11h30min, mais uma hora
e meia de musculação. Quando chegava perto das competições, treinava a tarde também. Isso sem contar os dias de chuva e frio.
Myung: Com o que você sonha à noite?
Fabiana: Sonho com as coisas que faço no dia a dia, ouço conversas e sinto toques.
Lucelina: Como você percebeu este espaço que estamos agora?
Fabiana: É difícil saber exatamente como é o espaço, mas sei que tem muitas crianças e que é um espaço fechado, com paredes.
Karina: Como foi participar de tantas Olimpíadas? Você teve patrocínio?
Fabiana: Participar de uma Paralimpíada é algo sem explicação. A competição só começava quando eu entrava no estádio. Quem vê na televisão não tem idéia. Quando
você percebe aquele monte de gente, você pensa na sua trajetória, em tudo o que você deixou de fazer. Até Sidney não tinha patrocínio, meu pai que me ajudava. Depois
consegui alguns patrocinadores. Mas hoje em dia as empresas têm investido mais nos atletas paralímpicos.
Rafaela: Como você não bate em outros nadadores?
Fabiana: Cada um nada na sua raia, são 8 competidores por vez, se você passar para outra raia está desclassificado.
Matheus: Acontece acidentes?
Fabiana: Se o Taper não avisar você pode se machucar, quebrar o dedo ou bater a cabeça. Para se localizar, eu nadava bem perto da raia e por isso meus dedos viviam
cortados.
Mikaela: Você tem vontade de ver alguma coisa?
Fabiana: Como eu nasci assim, eu me adaptei bem. Eu sinto falta de poder dirigir.
Gabriel Carvalho: Por que você não está nestas Paralimpíadas?
Fabiana: Depois de Pequim eu parei de nadar. Como atleta eu conquistei todos os títulos que eu queria, o brasileiro, mundial, panamericano, olimpíadas e recorde.
Marcela: Como você veio?
Fabiana: Eu fiquei assistindo os Jogos e por isso não vim de ônibus, meu pai me trouxe.
Glauco: Quantos anos sua irmã tinha quando quase se afogou?
Fabiana: Cinco anos.
Agnaldo: Seu irmão foi seu treinador? Como você vê? Preto ou branco?
Fabiana: Meu irmão foi meu treinador depois de 2005 e eu nunca vi cor, eu percebo se está claro ou escuro.
Bruno: Quantas medalhas de ouro você tem?
Fabiana: Muitas, umas 30 ou 40.
Rafaela: Como você anda de ônibus?
Fabiana: Quando é um caminho que você faz sempre, você acaba se acostumando. Decora uma lombada, uma subida ou alguma referência. Quando não tem segurança de onde
é direito, pede ajuda ao motorista e ao cobrador.
Ana Elisa: Você mora sozinha?
Fabiana: Não, ainda moro com meus pais.
Marcela: Você tem namorado?
Fabiana: Já namorei, mas hoje estou sem namorado.
Rodrigo Picollo: Você já pensou em competir outro esporte?
Fabiana: Não, mas gosto de andar de bicicleta.
E foi assim a visita desta atleta super importante para a história do Esporte Paralímpico brasileiro. As crianças ficaram impressionadas coma quantidade de coisas
que uma pessoa cega pode fazer e perceberam que as dificuldades não devem limitar você de tentar fazer as coisas.
Fonte:
Blog do Programa Curumim do SESC Campinas
Foi muito bacana estar com vocês.
Agradeço a equipe do Curumim por esta oportunidade.
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